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Filhos como Armas: O Jogo Cruel da Alienação Parental Pós-Divórcio

  • Foto do escritor: Ana  Olliveira
    Ana Olliveira
  • 11 de nov.
  • 5 min de leitura

Atualizado: 14 de nov.

Quando a não aceitação do fim se transforma em violência psicológica contra os filhos, a lei e a justiça precisam intervir.


O Fim Que Não Acaba


O divórcio é, por si só, um processo de luto. No entanto, em alguns casos, o luto de um dos parceiros se transforma em uma guerra não declarada. A dificuldade em aceitar o fim da relação conjugal faz com que essa pessoa, incapaz de ferir o ex-parceiro diretamente, encontre a arma mais covarde e eficaz: os próprios filhos.

O exemplo que motiva este artigo é real e devastador: uma mãe que utiliza o filho, instruindo-o a criar e enviar fotos manipuladas com o objetivo claro de perturbar e ridicularizar o pai.. Este não é um ato isolado de raiva. É uma tática deliberada que se encaixa perfeitamente em um conceito legal e psicológico muito grave: a Alienação Parental.

Este artigo vai analisar o que é esse comportamento, o que mais ele pode envolver e quais são as respostas da psicologia, da lei e da justiça brasileira.


A Visão Psicológica: O Conflito de Lealdade


Do ponto de vista psicológico, o que está em jogo é a incapacidade do adulto (o genitor alienador) de separar seus papéis. A pessoa que não aceita o fim vê o ex-parceiro como um "inimigo" e, por não conseguir mais travar a batalha conjugal, ela transfere o conflito para a esfera parental.

O filho se torna um "soldado" nessa guerra.

  • Conflito de Lealdade: A criança é colocada em uma posição impossível. Para se sentir amada e aceita pelo genitor alienador (com quem geralmente passa mais tempo), ela precisa "comprar" a narrativa de que o outro genitor é mau, desonesto ou desinteressado.

  • Dano Psíquico: Ensinar um filho a "manipular fotos para perturbar o pai" é ensiná-lo a ser cruel. É corromper sua bússola moral e forçá-lo a atacar uma das suas figuras de apego. Psicologicamente, é como dizer à criança para odiar uma parte de si mesma.

  • Consequências a Longo Prazo: Crianças vítimas de alienação parental severa têm maior probabilidade de desenvolver depressão, ansiedade, transtornos de personalidade, dificuldade em criar vínculos saudáveis na vida adulta e, ironicamente, um profundo ressentimento futuro contra o próprio genitor que a usou.


    O "Jogo Sujo": O Que Mais Pode Ser Feito?


    A sua pergunta foi: "o que mais poderá essa mulher fazer usando os filhos como arma?". A legislação brasileira, ao definir alienação parental, criou um "catálogo" dessas táticas.

    O "jogo sujo" vai muito além de manipular fotos. Ele inclui:

    • Desqualificação Constante: Falar mal do pai, de sua profissão, de sua nova família, de suas habilidades. ("Seu pai não paga a pensão direito", "Ele não te ama, prefere a namorada nova").

    • Criação de Falsas Memórias: Implantar na criança a ideia de que o pai cometeu atos que nunca aconteceram, desde pequenos desprezos até acusações graves de abuso (o que nos leva à esfera criminal, como veremos).

    • Dificultar o Contato: Criar empecilhos para os dias de visita. Marcar compromissos (médico, festa de amigo) exatamente na hora do pai. "Esquecer" de avisar sobre reuniões da escola.

    • Controle e Interceptação: Controlar todas as ligações ou mensagens, exigindo que a criança coloque no viva-voz, e depois puni-la se ela demonstrar afeto pelo pai.

    • Recompensa pelo Ódio: Dar presentes ou elogiar a criança quando ela rejeita o pai ou o trata mal.

    • Mudar de Cidade/Estado: Em casos extremos, mudar-se para um local distante sem justificativa plausível, apenas para quebrar o vínculo físico entre pai e filho.


    O Escudo da Lei: A Lei de Alienação Parental


    Essa conduta não é apenas imoral; ela é ilegal.

    A principal ferramenta jurídica é a Lei nº 12.318/2010 (Lei da Alienação Parental).

    • O que ela diz? O Art. 2º define alienação parental como "a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores... para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este."

    • Exemplos na Lei: O parágrafo único do Art. 2º lista exatamente as táticas que mencionamos acima, incluindo "realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor" e "dificultar o exercício da autoridade parental".

    Importante: Alienação Parental é um Ilícito Civil, mas pode envolver Crimes.

    O ato de alienar, por si só, é tratado na esfera de Família (cível). No entanto, as ferramentas usadas no "jogo sujo" podem ser crimes:

    1. Crimes Contra a Honra (Art. 138-140 do Código Penal): Se a mãe faz acusações falsas sobre o pai para terceiros (difamação) ou para a própria criança (injúria).

    2. Denunciação Caluniosa (Art. 339 do CP): Este é gravíssimo. Ocorre quando a mãe vai à polícia ou à Justiça e acusa o pai de um crime (como abuso sexual) que ela sabe ser falso, apenas para afastá-lo dos filhos. A pena é de reclusão e multa.

    3. Desobediência a Ordem Judicial (Art. 330 do CP): Se um juiz já determinou um regime de visitas e a mãe o descumpre repetidamente.


    A Resposta da Justiça: O que Acontece na Prática (Jurisprudência)


    Quando a alienação parental é comprovada na Justiça (geralmente por meio de perícia psicossocial), o juiz não fica de braços cruzados. A própria Lei 12.318/2010 dá ao magistrado um arsenal de medidas, que podem ser aplicadas gradualmente ou de forma cumulativa:

    1. Advertência: O juiz chama a genitora e a adverte formalmente sobre sua conduta.

    2. Multa: Aplicação de multa por cada ato de descumprimento (por exemplo, cada visita frustrada).

    3. Acompanhamento Psicológico: Determinação de terapia obrigatória para a mãe (alienadora) e para a criança.

    4. Ampliação do Convívio: O juiz pode aumentar o tempo do pai com a criança, para tentar reverter o dano.

    5. Inversão da Guarda: Em casos graves e reiterados, onde a mãe demonstra ser uma ameaça psicológica ao filho, o juiz pode tomar a medida mais drástica: a inversão da guarda. A guarda principal passa para o pai, e a mãe passa a ter visitas (às vezes monitoradas).


    E a Jurisprudência sobre Danos Morais?


    Sim, é possível. Os tribunais brasileiros (jurisprudência) têm consolidado o entendimento de que o genitor que pratica alienação parental comete um ato ilícito que viola os direitos da personalidade do filho (seu direito à identidade, à convivência familiar e à saúde psíquica).

    Baseando-se no princípio de que "cuidar é dever" (famoso em decisões do STJ sobre abandono afetivo), o pai (vítima) pode, em nome próprio ou em nome do filho, processar a mãe por danos morais decorrentes do sofrimento e do trauma psicológico causados por essa campanha de ódio.



    Conclusão: Não é Amor, é Abuso


    Uma mãe que usa o filho como arma para ferir o ex-parceiro não está agindo por amor ao filho; ela está agindo por seu próprio ego ferido. Ela falha em sua obrigação mais básica de proteção.

    O que ela faz não é "coisa de divórcio difícil", é abuso psicológico infantil. A lei e a psicologia são claras: a criança tem o direito de amar e ser amada por ambos os pais. Impedir isso não é apenas cruel, é ilegal e traz consequências severas.

 
 
 

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